O culto cristão hoje tem sofrido sérias transformações. Arrisco em dizer que são mudanças perigosas e, em alguns casos, até antibíblicas. Igrejas que tem procurado elaborar um tipo de culto-show para agradar e satisfazer o ego do auditório. Parece que a mentalidade hoje é dar o que as pessoas querem! Insistem em dizer que o povo precisa de um culto diferenciado e atrativo.
Com isso, as pessoas estão desesperadas em busca de satisfação pessoal nos cultos, do que qualquer outra coisa. A pregação da verdade, a reverência e o santo temor já foram, em algumas comunidades, abandonadas. E isso tudo me faz pensar como reagiria, por exemplo, o profeta Isaías [cf. Is 6] em nossos cultos contemporâneos prestados a Deus. Será que Isaías encontraria nessas adorações extravagantes um senso de temor, assombro, reverência e admiração pela glória de Deus?
Robert L. Dickie escreveu certa vez:
"Vemos cultos de adoração sem qualquer reverência, temor, respeito ou admiração. Em muitas das nossas igrejas, já não existe uma exortação ao arrependimento, à santidade de vida, a levarmos nossa cruz, à abnegação ou a reconhecermos Cristo como nosso Senhor. Parece que muitos pastores têm medo de ofender as suas congregações e, por isso, pregam para agradar os ouvintes, em vez de pregarem para agradar a Deus. É aconselhável todos os pastores lembrarem as palavras do apóstolo Paulo, em Gálatas 1:10: ‘Procuro agradar a homens? Se agradasse ainda a homens, não seria servo de Cristo’."
E diz mais:
"Que aspecto da adoração produz esse senso de temor reverente e admiração? Não devemos esquecer que adorar a Deus significa aproximar-nos dEle e sentir a sua presença. É interessante notar que, ao conhecermos exemplos de pessoas que se aproximaram de Deus ou se acharam em sua presença, percebemos que a atitude delas era de temor, assombro e reverência. Nas Escrituras, as pessoas sobre quais lemos que estavam na presença de Deus nunca eram levianas, irreverentes ou apáticas. Quando a verdadeira adoração na sala do trono estiver acontecendo, haverá esse espírito de reverência e de santo temor da grandeza de Deus."
No entanto, o que se percebe em algumas reuniões evangélicas, são inovações superficiais e tolas substituindo a adoração a Cristo, e pessoas buscando para si mesmas a glória que somente ao Senhor é devida. A. W. Tozer em The Pursuit of God é incisivo sobre isso:
"Grande parte da igreja perdeu completamente a arte da adoração e no seu lugar surgiu aquela coisa estranha e alheia chamada o ‘programa’. Esta palavra foi emprestada do teatro e aplicada com uma sabedoria lastimável ao tipo de culto público que agora é aceito como adoração entre nós."
Tozer tem razão. Os cultos repletos de inovações e atrações espetaculares têm desviado a nossa atenção do culto genuinamente cristão. Lamentavelmente, as pessoas hoje já não estão mais interessadas em contemplar a glória e a beleza de Cristo, e ouvir a pregação e a verdade do evangelho das Escrituras. O que querem são emoções vazias e superficiais, anestésicos para os seus problemas cotidianos.
Deus não está precisando de espectadores. A Bíblia diz (em João 4:23) que Deus procura verdadeiros adoradores, que O adorem em espírito e em verdade. Ele não procura espectadores que assistem um culto. Ele quer adoradores que participem ativamente de um culto.
Em um artigo intitulado Um Templo ou um teatro?, Charles H. Spurgeon escreveu:
"Por meio de apresentações dramatizadas, os pastores fazem com que as casas de oração se assemelhem a teatros; transformam o culto em shows musicais e os sermões, em arengas políticas ou ensaios filosóficos. Na verdade, eles transformam o templo em teatro e os servos de Deus em atores cujo objetivo é entreter os homens. Não é verdade que o Dia do Senhor está se tornando, cada vez mais, um dia de recreação e de ociosidade; e a Casa do Senhor, um templo pagão cheio de ídolos ou um clube social onde existe mais entusiasmo por divertimento do que o zelo de Deus?"
Confira o que Joêzer Mendonça, escritor, doutor em Musicologia (Unesp) com ênfase na relação entre teologia e música na história do adventismo, e professor na PUC-PR, fala sobre a música contemporânea de louvor e seu reflexo nos púlpitos:
"Há quase uma relação direta entre uma sociedade que supervaloriza o sucesso pessoal e igrejas que trocaram o sermão bíblico pela palestra motivacional. Queremos tanto resolver nossos problemas profissionais e familiares que, ao chegarmos na igreja, esperamos uma mensagem terapêutica que nos faça rir, chorar e tomar boas decisões que duram até alcançarmos a porta de saída do templo.
De modo idêntico, a música acaba sendo utilizada para levantar o espírito dormente das pessoas antes do sermão. Ou seja, a música deixa de ser usada como mensagem de adoração e edificação congregacional e passa a servir a um exercício terapêutico de subir e descer as emoções nas asas do louvor.
Qual é o sermão que estamos pregando através das letras de nossas músicas? Se considerarmos a música um espelho do púlpito, um reflexo da proclamação do evangelho, então veremos canções de teologia sólida e poesia criativa refletindo positivamente sermões consistentes e nutritivos, mas, infelizmente, veremos também músicas espelhando sermões superficiais."
Creio que precisamos de forma genuinamente bíblica, nos voltar para o culto que arranca o orgulho do nosso coração e nos constrange a dizer: ai de mim, pecador! Assombrar-nos pela presença poderosa de Deus com um santo temor reverente e profunda admiração pela Sua glória e livre graça soberana!
Com relação ao comportamento na casa de Deus, Ellen G. White nos advertiu:
"Houve uma grande mudança, não para melhor mas para pior, nos hábitos e costumes do povo com relação ao culto religioso. As coisas sagradas e preciosas, destinadas a prender-nos a Deus, estão quase perdendo sua influência sobre nosso espírito e coração, sendo rebaixadas ao nível das coisas comuns. A reverência que o povo antigamente revelava para com o santuário onde se encontrava com Deus, em serviço santo, quase deixou de existir completamente. Entretanto, Deus mesmo deu as instruções para Seu culto, elevando-o acima de tudo quanto é terreno" (Testemunhos Seletos, vol. 2, p. 193).
"Todo o culto deve ser efetuado com solenidade e reverência, como se fora feito na visível presença do próprio Deus. Deus deve ser a razão exclusiva de nossos pensamentos e de nossa adoração; qualquer coisa tendente a desviar a mente de Seu culto solene e sagrado constitui uma ofensa a Ele" (Conselhos para a Igreja, p. 258).
"Muito facilmente o povo de Deus se satisfaz com meras verdades superficiais. Diligentemente devemos procurar as verdades profundas, eternas e de grande alcance da Palavra de Deus" (Conselhos sobre Mordomia, p. 149).
Portanto, que a igreja de Cristo em nossos dias, se volte de fato para o genuíno culto cristão encontrado nas Escrituras, certificando-nos se o nosso culto a Deus na terra tem refletido o exemplo e a direção da adoração celestial. Precisamos acordar. O declínio é um lugar perigoso para ficarmos. Não podemos ser indiferentes. Não podemos continuar em nossa busca insensata por prazer e auto-satisfação. Somos chamados a lutar uma batalha espiritual e não poderemos ganhá-la apaziguando o inimigo.
Uma igreja fraca precisa se tornar forte, e um mundo necessitado precisa ser confrontado com a mensagem de salvação; e talvez haja pouco tempo para isso. Como Paulo escreveu à igreja em Roma: "Já é hora de vos despertardes do sono; porque a nossa salvação está agora mais perto do que quando no princípio cremos. Vai alta a noite, e vem chegando o dia. Deixemos, pois, as obras das trevas e revistamo-nos das armas da luz" (Rm 13:11,12).